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Agricultores familiares contribuem para a qualidade da alimentação nas escolas

12/05/2015

O cenário tranquilo, verde e produtivo da Fazenda Matos, na Comunidade Matos de Cima, em Capim Branco, na região Central, representa bem a agricultura familiar em Minas Gerais. Com simplicidade e variedade, a família Moura aproveita a fertilidade da terra e a experiência produtiva para garantir, por gerações, o sustento que vem da atividade agropecuária e agricultura de subsistência.

Na pequena propriedade rural, o casal Raimundo Avelar Moura, 76 anos, e Maria Aparecida de Moura, 74, e os três filhos, Ênio, 52, Luiz Henrique, 53, e Raimundo Jr., 49, se dedicam exclusivamente ao cultivo de leite, hortaliças e frutas. Em um passeio pelas terras da fazenda, é possível encontrar plantações que vão do urucum, mandioca e milho até a banana, tangerina e alface.

Hoje, a família vive dos ganhos da lavoura e comercializa seus produtos para municípios circunvizinhos (Sete Lagoas, Prudente de Morais e Matozinhos), feiras, entrega porta a porta e mesmo na própria fazenda. No entanto, é pelo cultivo de hortaliças e frutas orgânicas, mais saudáveis, que o trabalho dos Moura tem chamado a atenção. Isto porque, com o suporte do Governo de Minas Gerais, eles também têm conseguido direcionar parte de sua produção para a merenda escolar.

Política nacional

Por lei, é determinado que pelo menos 30% dos recursos recebidos pelo poder público sejam aplicados para aquisição de alimentos junto aos agricultores familiares. Para tanto, são divulgados editais de chamadas públicas por cada escola estadual/caixa escolar, para contratação de agricultores.

Garantir o fluxo para o fornecimento da alimentação escolar, em Minas Gerais, é uma das frentes de atuação da Secretaria de Estado de Educação (SEE), por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). A iniciativa nacional, que existe desde a década de 40, sob gerenciamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), realiza a transferência de recursos financeiros justamente para assegurar a alimentação escolar a alunos de escolas públicas por 200 dias letivos.

No Estado, a entidade executora é a SEE, que utiliza como modelo a escolarização. "Ou seja, os recursos financeiros recebidos na conta do PNAE são descentralizados mensalmente para cada escola estadual, por intermédio das Caixas Escolares", explica a coordenadora do Programa de Alimentação Escolar, Valéria Monteiro.

Desse modo, o repasse de recursos, processo de compras dos alimentos, licitação e chamada pública, execução dos cardápios, entre outras ações necessárias ao desenvolvimento do programa, "estão presentes nos diversos níveis da SEE, passando pelo órgão central, as 47 Superintendências Regionais de Ensino (SRE) e escolas estaduais", completa.

As orientações para o correto fluxo são repassadas às SREs e escolas por meio das Diretorias de Suprimento Escolar e de Prestação de Contas. Além disso, o material preparado, selecionado e ofertado para alimentação escolar segue as orientações e recomendações da cartilha 'Cardápios da Alimentação Escolar', elaborada pela equipe de nutricionistas da Diretoria de Suprimento Escolar.

A equipe, formada por sete profissionais (um nutricionista responsável técnico e seis nutricionistas do quadro técnico), também efetua supervisões técnicas nas escolas e capacitação para os envolvidos na alimentação escolar.

Em 2014, observa Valéria, "o PNAE na rede estadual atendeu cerca de 2,4 milhões de alunos em 3.615 escolas estaduais", detalha. O valor repassado pelo FNDE para a alimentação escolar foi superior a R$ 150,3 milhões, com R$ 28,6 milhões direcionados à aquisição de alimentos da agricultura familiar.

"A cada ano, as escolas estaduais têm conseguido adquirir mais alimentos da agricultura familiar e, com certeza, isto reflete em melhor qualidade da alimentação ofertada aos alunos", avalia Valéria.

Por meio do Sistema de Monitoramento da Execução da Alimentação Escolar (Sysmeae), a Secretaria de Educação pode acompanhar o valor gasto em alimentos adquiridos, principalmente aqueles originados da agricultura familiar. O lançamento das aquisições é feito pelas próprias escolas.

O sistema também contribui para fornecer dados para a página agriculturafamiliar.educacao.mg.gov.br, na qual os interessados podem verificar as demandas das escolas e as chamadas públicas cadastradas e/ou vigentes.

Programa estruturador

Justamente para cumprir com a obrigação legal de que o Estado compre no mínimo 30% da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando os assentados da reforma agrária, comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas (Lei 11.947/2009), Minas Gerais conta com um programa estruturador – o Cultivar, Nutrir e Educar.

Por meio da articulação dos segmentos Saúde, Educação e Agricultura, o programa atua para garantir a comercialização da produção da agricultura familiar para a alimentação escolar. De forma intersetorial nos níveis estadual e municipal, o programa, como destaca a gerente do Cultivar, Nutrir e Educar, Jacqueline Junqueira, “promove a ampliação da qualidade de vida dos agricultores familiares que comercializam sua produção, adquirem renda para viverem dignamente, adquirirem bens, obterem acesso a outras políticas públicas e produzirem alimentos em quantidade e qualidade para alunos nas escolas e para toda comunidade”.

O diferencial da ação está no aumento do potencial de desenvolvimento e efetividade das ações governamentais ao serem planejadas, executadas e avaliadas de forma articulada e participativa. “Os alunos recebem alimentação sabendo a origem dos alimentos, desenvolvem hábitos saudáveis, são estimulados a valorizarem produtos da região e ao consumo consciente, e também o autocuidado para qualidade de vida”, enfatiza Jacqueline. 

Suporte ao agricultor familiar

As equipes de agricultura do Estado, no contexto do programa, oferecem apoio direcionado à organização dos agricultores familiares. São ações que, desde 2012, com o advento do Cultivar, Nutrir e Educar, têm contribuído, por exemplo, para fomentar a produção e consumo de alimentos saudáveis, gerar ocupação e renda na agricultura familiar, por meio da qualificação e agregação de valor aos produtos, e, ainda, apoiar a organização dos agricultores familiares quanto à logística para realização de venda direta de produtos aos mercados institucionais.

Atualmente, essas competências passaram a estar vinculadas à recém-criada Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário (SDA). Segundo o superintendente de Acesso a Mercados e Comercialização, vinculado à Subsecretaria de Agricultura Familiar, Lucas Oliveira Scarascia, para o desempenho dessas atribuições, existe um contrato firmado junto à Emater-MG para a prestação de serviços e inserção dos agricultores familiares em todo o estado.

“Isto permite identificar e cadastrar agricultores familiares, promover orientações técnicas e cursos presenciais, acompanhar processos e diagnóstico de demanda e oferta de alimentos para abastecimento de escolas”, entre outros tópicos, aponta Scarascia.

No Programa Cultivar Nutrir e Educar, por meio do Projeto Estratégico de Fortalecimento da Agricultura Familiar para o Abastecimento Alimentar, foram atendidos, de 2012 a 2014, 3.600 agricultores familiares em 220 municípios. Entre os principais produtos cultivados, destaque para hortaliças, legumes, frutas, feijão, mel, leite, iogurte, polpa de frutas, fubá, farinha de mandioca, rapadura, bolos, biscoitos e outros panificados.

“O programa veio para aperfeiçoar as relações existentes entre agricultores e entidades executoras, promovendo a capacitação dos agricultores familiares e suas organizações, para a produção, processamento e comercialização”, conclui o superintendente.

Colhendo frutos

Antes do 'Cultivar, Nutrir e Educar', a família Moura, do sr. Raimundo e dona Maria Aparecida, não conhecia o mercado de comercialização para o PNAE. Desde que começaram a fazer parte do programa, há aproximadamente dois anos, parte da produção - em torno de 30% - vem tendo como destino certo a alimentação nas escolas.

"Com a parceria, a vida de todos melhorou, a começar pela oportunidade de comercialização. Agora, temos um projeto de venda, um contrato, venda e recebimento garantidos. Além disso, adquirimos mais experiência, conhecimento e pudemos fazer cursos", aponta o filho do meio, Ênio, 52.

Outro ponto de destaque é a consciência na oferta de um produto livre de agrotóxicos e, assim, poder participar da melhoria de qualidade da merenda escolar. "Temos prazer em saber que o consumo de nossos alimentos é feito para crianças e, acima de tudo, nossos sobrinhos e netos", comenta o produtor.

Na propriedade, a atividade pecuária é dedicada à bovinocultura de leite (6.000 litros por ano), suínos (50 por ano) e aves (500 galinhas e 600 dúzias de ovos, anualmente). Já a atividade agrícola cuida da produção de alface, quiabo, beterraba, cenoura, pepino e tomate (cerca de 20 toneladas anuais). As frutas respondem por 10 toneladas no ano, com produção de banana, laranja, limão, goiaba, tangerina, jabuticaba e manga.

No âmbito da parceria, o extensionista agropecuário da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG), Adenílson de Freitas, é figura recorrente na Fazenda Matos. Isto porque a Emater-MG oferece, aos agricultores familiares do programa estadual, apoio técnico e orientações para o cultivo sem agrotóxicos e produção de alimentos com melhor qualidade.

Em recentes contribuições, Adenílson deu dicas à família sobre como realizar a compostagem (produção de adubo orgânico) e, ainda, o emprego da tecnologia de túnel para o plantio de alface.

"É um recurso barato, acessível ao pequeno produtor e que permite manter a produção de alface, o que seria inviável no período chuvoso", observa o técnico. “Estamos trazendo para cá também o milho biofortificado, que não é geneticamente modificado e reúne altos teores de pró-vitamina A", complementa. Tanto o milho como o alface são produtos que, pelo valor nutricional e cultivo livre de agrotóxicos, têm utilização certa na merenda escolar.

Mais experiências

A agricultora Cleonice Soares, 44, natural de Felisburgo, nos Vales Jequitinhonha e Mucuri, no ano de 2010 se desdobrava na produção de biscoitos na própria casa. Era difícil conciliar o trabalho na cozinha e o ambiente para, por exemplo, receber uma visita, o que a deixava bastante incomodada. Com a oportunidade do Cultivar, Nutrir e Educar, e o suporte da Emater-MG, foi possível construir uma unidade de processamento, com recursos próprios e mutirão familiar.

O resultado foi a possibilidade de produzir intensamente biscoito de polvilho, bolo de laranja, bolo comum e pão caseiro. Em Córrego Brejaúba, na zona rural de Itaipé, onde vive com o marido e um dos filhos, Cleonice e sua equipe familiar conseguiram direcionar, no ano passado, por meio do programa, 300 kg de biscoito de polvilho, 600 kg de pão caseiro e 300 kg de bolo caseiro/bolo de laranja para duas escolas estaduais e para a secretaria municipal de Educação. "Agora o tempo está muito limitado!", destaca Cleonice, satisfeita por conseguir vender toda a produção, que aumenta cada dia mais.

A agricultora também participou de orientações sobre boas práticas de produção e conseguiu até mesmo comprar um carro para o transporte dos produtos. Poder contribuir para a alimentação escolar é outro fator que a deixa bastante contente. "Os alunos podem consumir produtos da produção do próprio município e, principalmente, quitadas de nossa cultura local", ressalta.

Luciane Costa, 40, natural de Ponte Nova, na Zona da Mata, integra um grupo de agroindústria coletiva, com seis integrantes. Há dois anos no programa, eles produzem, mensalmente, 4.000 kg de bananada e 4.000 kg de goiabada. "Antes, não tínhamos o local certo para entregar as mercadorias", conta Luciane.

Com a parceria, eles puderam investir na agroindústria, adequando a produção às normas sanitárias e, consequentemente, melhorando a qualidade da produção. Com isso, melhoramos o sustento de nossas famílias", comemora, feliz também por levar às crianças nas escolas uma alimentação rica em nutrientes.

Ainda em Ponte Nova, o agricultor Cláudio Alves, 53, que mora com a esposa e a filha, conseguiu otimizar o planejamento da produção, evitando perdas. Tudo isso a partir do programa estadual. "Sinto-me bem por oferecer um produto de qualidade e saudável", aponta.

Por mês, Alves consegue produzir 600 kg de banana, 45 kg de beterraba, 60 kg de repolho, 40 kg de cenoura e 100 kg de maracujá, produção esta que vai não só para a alimentação escolar, como também para venda no mercado local. "A garantia de mercado e renda mudou minha vida", acrescenta.